sábado, 14 de agosto de 2010

NAQUELA NOITE

  "O coração, em ritmo de dança frenética, beirava o frenesi num pulsar de batimentos acelerados.Mas ela confiava em sua mente, no GPS dos seus pensamentos, o caminho era nunca estar perdida.Mesmo em situações novas e inesperadas, a confiança inabalável de quem sempre sabia pra onde estava indo."



  Ela escolheu a noite mais congelante do inverno gaúcho para aquecer seu espírito.Vestiu sua empolgação combinando com o ar descolado, e o requinte das botas da moda.
  Estreiava a nova coleção, antes estampada na vitrine dos seus desejos.Estava leve no corpo, mas levava na alma o peso-morto das escolhas desaconselháveis, que outrora havia cometido.O amor, que esculhambou suas idéias.Os desenlaces breves de feridas superficiais, os atritos de um futuro iminente, determinado por sua busca impetuosa e constante pelo melhor para si.


  Ninguém ousaria dizer que ela não era decidida.Ah, isso ela era!Muito fiel a seus planos e multi-centrada em seus objetivos.A vida, vista da margem, pra ela era um oceano de possibilidades, e seu mapa de navegação, sempre ligado, uma bússola a prova de tempestades imprevistas.O coração, em ritmo de dança frenética, beirava o frenesi num pulsar de batimentos acelerados.Mas ela confiava em sua mente, no GPS dos seus pensamentos, o caminho era nunca estar perdida.Mesmo em situações novas e inesperadas, a confiança inabalável de quem sempre sabia pra onde estava indo.E no entanto, nesta noite...


  Nesta fria noite de ar sinistro, antes que o sereno acompanhasse a madrugada, ela saiu para o espairecer.O espairecer de ruas desertas e bares lotados.As casas noturnas entulhando gente, em filas quilométricas à espera pelo aconchego de novas estórias.Nas esquinas das praças, as filhas da noite vendendo suas carnes,em propagandas enganosas;Outdoors prometendo as mais belas mulheres pra quem encher a cara com uma determinada marca de cerveja, e os bêbados trôpegos,trágicômicos caindo pelas calçadas;
  Você pára o carro e vê o mundo, na sinaleira que não abre.Um filme que passa na janela do seu carro, e parece um filme pirata daqueles muito mal filmados.Você quase se arrepende por ter saído de casa, e pensa onde encontrará lugar.Para estacionar.Para estar.Para ficar e se sentir sim, em casa, porém com a sensação de que algo está para acontecer.


  Naquela mesma noite, no círculo polar ártico da sua roda de considerações.Por um estranho inequívoco acaso circunstancial,no poço de evidências circunstanciais que é o acaso, depois de algumas torpes aventuras e distantes madrugadas, eis que seus olhos voltam a se encontrar.E a banda tocava aquela mesma canção:"Last Nigth", o que acontecera conosco naquela última noite?Na última noite em que ela disse:-"Amor, me sinto tão deprê!" Ohhh quem entenderá?


  Parece que voltaram para o colchão macio dos braços um do outro.Deitaram-se sobre a grama para ver as estrelas e congelaram com a fina neve da estação.Ela tinha um sorriso insinuante em seus lábios.Como quem curou seu torcicolo no travesseiro ortopédico de largos ombros.Queria mais que fogo ou intimidade, queria uma companhia pra suas exóticas viagens.Que fosse bom, porém que não estivesse nos planos.


  Certezas que fogem pela janela quando surge o inesperado.O que vai do simples ao complexo dependendo apenas de um piscar de olhos. Depois de séculos, a mesma barba rala e a voz segura e tranquila, a mesma que outrora a deixava arredia, agora subitamente a acalmava.Era o melhor som do mundo.Era uma paz que a invadia.Contagiante e abusada, afirmando que viria para passar a noite.E decerto, ela nem queria isso.
Deixou de lado meia garrafa de uma bebida já choca, e correu para a pista de dança.Tinha que ouvir essa de perto. Tinha que celebrar a certeza que tanto havia sentido falta:Ter uma música sua, e alguém com quem a compartilhar!


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