quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

ENTRE METÁFORAS E LENÇÓIS






          Olho além desse momento, imagino a gente longe. Perdidos na nossa própria confusão aparente. Você diz que sabe pra onde devemos ir agora. Te olho como quem duvida que a sua sugestão será assim tão tentadora. Não diante do aconchego em que nos encontramos nesse momento, compartilhando visões do futuro na janela entreaberta das nossas almas obscenas. Vejo um filme passando em minha mente, enquanto você foge para baixo das cobertas. Reclama o ar gelado, e a minha frieza súbita. Você se torna a pessoa mais romântica do mundo pra resgatar a minha fé nesses momentos a dois. Como um cego tateando no escuro, me guio pela sua luz. Acredito nas possibilidades, quando você as insinua com um sorriso malicioso. Minhas dúvidas se dissipam como as nuvens quando absorvem os primeiros raios de sol. Nós amanhecemos insones, e abandonados à nossa própria sorte. No universo paralelo de uma cama bagunçada, onde dois corpos se acomodam como se ocupassem o mesmo espaço. se encaixando sutilmente como o prazer e o desejo, indo mais fundo a cada momento, até alcançar o ponto extremo.

            Você desperta dos meus sonhos quando me obriga a abrir os olhos. De repente, nos vemos imóveis diante do tempo e das circunstâncias que teimam em fugir ao nosso controle. Sua cabeça recostada no meu peito impede meus movimentos mais articulados. Abro mão da minha liberdade para te deixar mais confortável e à vontade. Faço dos meus ombros largos o seu travesseiro particular. 
            Espero que você acorde sem maiores sobressaltos, satisfeita e em paz com suas próprias escolhas- ao menos pelo tempo em que estivermos juntos- procurando descalça o seu salto, pisando suave o assoalho, como quem tem o cuidado de não me acordar da minha insônia, como quem não sabe bem se está no lugar certo, mas não faz questão de ir longe nos devaneios e nem sair muito depressa, a ponto de não receber um último primeiro beijo de bom dia, e um atencioso café sem açúcar, e sair com a certeza de que deverá voltar logo, e poderá pensar nisso com calma, sem nadar contra a correnteza da vontade, e nem contra a maré das expectativas.

Espero que a atmosfera silenciosa dos seus sonhos se harmonize com o canto matinal dos pássaros, para que eu não tenha que chamar seu nome logo cedo, como o chato estraga-prazeres escolhido pra te lembrar que já está na hora. Que adoraria permanecer o dia todo nessa preguiça gostosa, mas que essa não é infelizmente, uma escolha viável. Os dias não são tão românticos quanto Deus sonhou para a humanidade. Faz frio lá fora. E não me refiro a um estado físico ou psicológico. O mundo é exigente demais com os otimistas tolos e os apaixonados em busca de consolo. Eis que o despertador toca. Você levanta como um raio, que anuncia uma tempestade atrasada, mas que já está se insinuando no horizonte. Tem horário e tal. Eu entendo. Também preciso voltar à realidade. Melhor nos despedirmos das nossas frases pseudo-melosas, e das metáforas que o silêncio nos inspirou na intimidade. Temos os momentos como cúmplices e as paredes como testemunhas, do quanto foi sincero o nosso enlaçar de corpos e sensações.

            Que a memória honre o que a distância há de abraçar com dúvidas. Que a nossa saudade guarde vestígios das lembranças, como fotos capturadas no instante exato em que sucederam os fatos. E que só serão reveladas na cumplicidade secreta dos nossos sorrisos, e nos olhares indiscretos trocados em momentos únicos, quando ninguém mais percebe que aquelas duas almas já compartilharam- mais do que palavras e silêncios constrangedores- os mesmos desejos na forma de um encontro, entre metáforas e lençóis.




           

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