domingo, 7 de dezembro de 2014

POR UM ENCONTRO OU UMA BEBIDA...


     


      Te encontro ao acaso de uma noite sem planos, parada na sua, à espera da sua bebida colorida, fazendo sinal para o bartender distraído. Você tem pressa, e uma multidão pela frente para retornar ao seu lugar favorito. Sua amiga esta lá, desesperada, ouvindo besteiras e coisas inconvenientes. Mas ela é guerreira, e aguenta, e não se estressa, e ainda guarda o seu lugar improvisado e sem numeração. O show está quase começando. Você deseja estar perto do palco. Acha que lá consegue sentir melhor a vibração e a energia da música. É uma concepção muito particular sua, de que é preciso fechar os olhos e se deixar envolver pelo que rola ao seu redor.
      Até seria bom ter alguém interessante para iniciar uma conversa, só para tirar um pouco o foco dos problemas, distrair o ego e a cabeça, de preferência na hora em que não estivesse tocando uma das suas canções favoritas. Seria melhor ainda se ele não viesse com as mesmas cantadas prontas de sempre, assuntos fora de contexto, e que não te elegesse a segunda ou terceira opção da noite. Não que seja um pré-requisito determinante, mas se ele fosse naturalmente charmoso, conservasse algum estilo próprio, e soubesse conduzir uma conversa de forma espontânea, dosando um pouco de humor com um interesse genuíno pela sua pessoa. Bom, não seria nada mal! Elegância, beleza e simpatia sempre colaboram para que as coisas fluam melhor em casos como esse, você sabe, mas também não estão no topo da sua lista de prioridades. Não diante das circunstâncias em que a noite se apresenta.
     Sua bebida ainda está demorando. O que houve com esse garçom? Foi procurar no estoque os ingredientes da sua poção mágica e entorpecente? Talvez fosse melhor ter apelado para um bom e velho chope. Mas a semana na academia não recomenda. É preciso ser forte, como diz sua personal. E manter a calma numa hora dessas, com tantos chatos te importunando. Você nem sabe qual ignora primeiro. Ser educada nesse caso, pode parecer um incentivo a ir em frente. Melhor ficar calada e sinalizar para sua amiga que já está quase desistindo. Mas ei, eis que ele reaparece, o bartender amarrado, talvez seja agora a sua hora de ser atendida. Finalmente, uma bebida sintética e álcoolorida saindo... 


     Você precisa é de uma ajudinha do acaso, isso sim. Um sorriso com patrocínio da sorte, e promovido pela chance de encontrar diversão e reconsiderar seus motivos, e conceitos formados sobre a superficialidade de tudo que acontece na noite. Algo que te faça dançar a noite inteira, e nem ver passar o tempo. Tipo uma dessas coincidências inexplicáveis que a gente sente que vão nos trazer boas recordações no futuro. Que vamos ficar brincando de adivinhar qual era a roupa que usávamos, qual a música que tocava, ou qual a comida que pedimos. O que esperávamos encontrar quando saímos de casa, quais eram as nossas reais expectativas...
     A gente nunca sabe quais são. E por mais que se negue, elas estão sempre lá, marcando presença, cercando sutilmente as nossas impressões. Como alguém que conhece todos os nossos hábitos e manias, e insiste em querer saber mais, mesmo diante do aviso de:"Cuidado, não se aproxime!" Como se isso representasse um incentivo, e não um considerável risco diante das circunstâncias em que você se encontra. Todos somos vulneráveis quando nos envolvemos com outra pessoa. Isso é inevitável. E diante desse fato, é melhor conservar expectativas realistas ao invés de tentar ingenuamente acreditar que é possível evitá-las por completo.

     No fundo, tudo é surpreendentemente novo. Os começos são sempre cercados de uma aura de mistério e descoberta. Quem se acostuma com eles, é capaz de passar a vida inteira conhecendo pessoas, e nem reclamar de não voltar a vê-las. Tudo é baseado no clique instantâneo do olhar que cola, do jeito que combina, da intenção que vai de encontro ao desejo propriamente dito, ou não dito, mas sentido, de uma forma que não deixa dúvidas: o que acontece ali precisa ser vivido. É para ser, e não hesitar.

    Mas não foi nosso caso. Acho que a gente meio que sabia bem o que queria. Acho que desenvolvemos aquela percepção de adivinhar logo de cara o que havia de secreto nas nossas razões subentendidas. Nós fomos direto ao ponto, e o ponto era exatamente onde nos encontrávamos, à espera de alguém que mexesse com nossas convicções de improviso, que nos tirasse de um estado de seriedade comovente, e mudasse o nosso conceito sobre a impossibilidade de concretizar qualquer coisa real e que valesse uma boa saudade depois. E assim, nós botamos fé um no outro, e de repente, isso foi o que fez toda a diferença. Foi o que nos deu base para sustentarmos nossa visão de mundo, e compartilharmos nossas célebres experiências em forma de histórias. Eu falei, você me ouviu. Você falou, eu te dei atenção. Houve um contraste interessante entre olhares, gestos e palavras. E isso foi fundamental. Agora, não sei. Isso talvez sirva como um radar para identificarmos potenciais romances. Possibilidades relevantes, encontros promissores. 
     Talvez o que deu certo no passado seja como um GPS para um caminho no futuro, e nós devemos nos basear naquela voz interior, naquilo que sabemos que nos capturou de alguma forma, por breves momentos, ou pelo tempo que foi necessário, ou que nós nos permitimos viver plenamente, e fomos deixando acontecer, até onde o destino foi capaz de nos levar. 


    É simples, se você pensar. A gente dificulta por medo de voltar a cometer velhos erros e se ver batendo novamente contra um muro de concreto das emoções não desejadas. Mas não importa, lidar com outro universo é assim mesmo, uma estrada itinerante com belas paisagens e informações desencontradas, que nos guiam conforme a posição das estrelas e a direção dos ventos. E nos ensinam a seguir o que acreditamos ser o melhor caminho. A intuição é o nosso único recurso confiável, e as sensações, o nosso combustível vital. Há sempre um destino ideal, camuflado de sonhos, ricos em detalhes e um horizonte, que parece mais próximo, à medida que nos afastamos do que pensávamos ser a única alternativa possível.
     Mas a melhor parte da felicidade ainda é que ela não se resume à algo ou alguém, nem se restringe a um momento ou outro. Você pode estar aí parada, observando o movimento, ou ansiosa esperando alguma coisa que demora, mas quando menos esperar, de repente, ela te pega de novo de jeito, te puxa com força e delicadeza pelos cabelos e te olha fundo nos olhos, como quem diz: "Esqueça o que estava procurando, eu tenho coisa bem melhor para mostrar pra você."
     E assim, quando a sua bebida finalmente chega, você já não está mais tão sedenta e apressada, e nem mais tão a fim de beber, seja para lembrar, ou para esquecer... Você só pede silenciosamente que toque novamente aquela música, que quando tocou você nem percebeu. E torce, para que não esteja sozinha, cultivando a esperança, de que essa noite termine melhor do que começou. E que as possibilidades agora, mais uma vez se renovem por mais algumas estações...



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